Meu nome é Ataualpa A. C. Braga, sou professor do Instituto de Química da USP, em São Paulo. Para explicar como a Catálise mudou minha vida, tanto pessoal quanto profissionalmente, preciso começar com um pouco de contexto. Sou da primeira geração da minha família a cursar o ensino superior — e não foi fácil. Filho de uma dona de casa (Maria do Carmo) e de um peão de obra que se especializou em lubrificação (Antonio Braga), nasci em Foz do Iguaçu, em função do trabalho de meu pai na Itaipu. Desde então, não parei de me mudar: onde havia um rio e uma represa, lá estávamos nós. Morei em 14 cidades diferentes, incluindo dois anos em Nassiriya, no Iraque. De volta ao Brasil, fiz o antigo colegial em Planura, Minas Gerais, até passar no vestibular para Química na Unicamp (Campinas).
Desde o primeiro ano da graduação, tive minha primeira oportunidade de pesquisa no grupo do Prof. Pires Valente (Química Analítica), desenvolvendo estratégias de pré-concentração de pesticidas para cromatografia gasosa. No último ano, movido pela curiosidade sobre processos físico-químicos em nível atômico e pela vontade de aprender programação, migrei para o nascente grupo de Química Computacional do Prof. Nelson Morgon. Estudei equilíbrios ceto-enólicos e desenvolvi conjuntos de funções de base (funções gaussianas para construir os orbitais atômicos e moleculares) pelo método da coordenada geradora. Defendi o mestrado com a convicção de que seguiria na química teórica.
Em 2000, iniciei o doutorado na Unicamp, ainda no grupo do Prof. Morgon, estudando propriedades de fulerenos endoétricos via o método híbrido ONIOM — que combina mecânica quântica e mecânica molecular. Ao revisar a literatura, conheci o trabalho do Prof. Feliu Maseras, que, na época de pós-doutorado com o Prof. Morokuma, foi pioneiro na implementação desse tipo de método híbrido. O Prof. Maseras já estava estabelecido como líder de grupo na UAB (Universidade Autônoma de Barcelona) e interessado em catálise. Embora meu conhecimento no tema se restringisse às aulas da graduação, decidi aceitar o desafio de mudar completamente o tema do meu doutorado e colaborar com ele — decisão da qual nunca me arrependi, pois mudou minha trajetória.
Nosso objetivo era aplicar o método ONIOM ao estudo da reação de Suzuki–Miyaura, focando na etapa de transmetalação e nos caminhos associativo e dissociativo envolvendo ligantes fosfina em complexos de paládio. O principal resultado foi publicado em 2005 no Journal of the American Chemical Society — artigo citado pelo próprio Suzuki em sua palestra ao receber o Prêmio Nobel, em 2010. Após defender o doutorado, fui convidado para um pós-doutorado no ICIQ (Instituto Catalão de Investigação Química), em Tarragona, também sob supervisão do Prof. Maseras. Minha esposa (Andreia), minha filha (Laís) e eu nos mudamos para a Catalunha com planos de permanecer um ano — e tudo ia tão bem, profissionalmente e pessoalmente, que acabamos ficando seis anos!
Em 2011, retornei ao Brasil para um pós-doutorado na Unicamp, com um projeto de catálise homogênea envolvendo reações de Heck–Matsuda, em colaboração com o Prof. Carlos Roque e sob supervisão do Prof. Morgon. Em 2012, ingressei no Instituto de Química da USP, onde estou até hoje. Tenho orgulho de termos formado 10 doutores e 3 mestres nesses anos. Nosso grupo começou focado no estudo de mecanismos em catálise homogênea e, atualmente, atua em temas diversos — com destaque recente, ainda em fase seminal, para a catálise heterogênea envolvendo zeólitas.
Olho para trás e vejo como a Catálise foi, de fato, um divisor de águas na minha vida. Compartilhar essa trajetória na SBCat é um privilégio. O projeto “Quem Somos?” é uma excelente iniciativa, que espero possa aproximar ainda mais nosso grupo — que tem forte vocação para colaborações com grupos experimentais — de pesquisadores interessados no desenvolvimento de processos catalíticos cada vez mais eficientes.